A Reforma Tributária do consumo (EC 132/2023) inaugura o modelo de IVA dual no Brasil: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), compartilhado por estados e municípios. Esses tributos substituirão PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS ao longo de um período de transição extenso (2026‑2033). A boa notícia é a promessa de simplificação e neutralidade; a má é que, até a linha de chegada, as empresas conviverão com dois sistemas sobrepostos, o que amplia risco operacional e pressiona contratos celebrados sob o regime antigo.
Panorama geral da Reforma Tributária (EC 132/2023)
O desenho constitucional aprovado substitui a colcha de retalhos de tributos sobre consumo por um IVA dual inspirado em padrões internacionais. A CBS absorverá PIS/Cofins e o IBS sucederá ICMS/ISS; ambos serão não cumulativos, com incidência ampla sobre bens e serviços e crédito financeiro ao longo da cadeia. A EC também cria o Imposto Seletivo (IS), de caráter regulatório, para desestimular produtos nocivos. A motivação declarada: simplificar, aumentar transparência, reduzir custos de conformidade e reequilibrar a competitividade entre setores — objetivos que o setor produtivo, representado por entidades como a CNI, defende há anos.
Veja também: CBS vs PIS/COFINS: quais serão as diferenças?
Cronograma de transição da Reforma Tributária 2026 a 2033
A transição começa com o ano‑teste de 2026, quando valores simbólicos de 0,9% (CBS) e 0,1% (IBS) devem ser destacados nas notas fiscais. Esses montantes funcionam como “prova de sistema”: servem para calibrar plataformas de apuração e fluxo de dados; os valores recolhidos podem ser compensados com o que seria devido de PIS/Cofins no mesmo período e, para contribuintes que cumprirem todas as obrigações acessórias, há previsão de dispensa do recolhimento efetivo.
A partir de 2027, inicia‑se a substituição real: extinção progressiva de PIS/Cofins e entrada efetiva da CBS; instituição do Imposto Seletivo; manutenção dos tributos subnacionais até que o IBS ganhe peso. Entre 2029 e 2032, ICMS e ISS são gradualmente reduzidos enquanto o IBS cresce, em etapas definidas em legislação complementar e calibradas pelos entes federados. Em 2033, o modelo antigo sai de cena e a tributação sobre consumo passa a ser feita integralmente via CBS e IBS (com IS em paralelo).
Dois sistemas em paralelo: complexidade e custo de compliance
O período de transição não reduzirá imediatamente a burocracia; ao contrário, a coexistência de regras antigas e novas aumenta o número de códigos tributários, parametrizações de ERP, cruzamentos de crédito e obrigações acessórias. Estudo do Instituto Fiscal Independente do Senado destaca que, embora a simplificação estrutural seja o objetivo, a fase de transição tende a elevar a complexidade pela convivência simultânea de dois sistemas de tributação.
Pesquisas com empresas revelam apreensão: conviver com dois sistemas até o fim da transição é a principal preocupação em levantamento citado pela CNN Brasil; custos de conformidade já são apontados pelo setor produtivo como entrave competitivo e razão central para apoiar a reforma.
Por que contratos antigos estão em risco tributário
Contratos de longa duração — especialmente aqueles que precificam serviços “ISS incluso”, fornecimentos “ICMS incluso” ou utilizam fórmulas baseadas em margens líquidas sob a tributação atual — podem ser desestruturados quando as alíquotas efetivas migrarem para CBS/IBS. A fase de teste de 2026 é frequentemente tratada como simbólica, mas especialistas alertam que ela já exige adaptação de sistemas, destaque de valores e revisão de cláusulas para definir quem responde por diferenças futuras; ignorar essa etapa pode resultar em litígios quando o novo regime ganhar tração.
Mudanças de carga tributária em contratos públicos podem configurar fato do príncipe ou alterar o equilíbrio econômico‑financeiro; em contratos privados, lacunas sobre repasse de tributos geram disputas diretas de preço e margens. Pesquisas com empresas mostram temor de custos imprevistos durante a transição — um alerta adicional para revisar instrumentos vigentes.
Reequilíbrio econômico‑financeiro: Lei 14.133/2021
A Lei 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos) prevê mecanismos de recomposição quando fatos supervenientes — inclusive criação, alteração ou extinção de tributos — impactam os encargos originalmente assumidos. O Tribunal de Contas da União destaca que aumentos ou reduções de tributos diretamente pagos pelo contratado, por força de legislação posterior, podem justificar pedido de reequilíbrio, respeitada a matriz de riscos pactuada.
Comentários doutrinários apontam que a alteração tributária decorrente da reforma pode enquadrar‑se como fato do príncipe ou álea extraordinária, abrindo espaço para revisão contratual, especialmente em concessões e outras contratações de longo prazo. O ponto crítico: o pleito deve ser formalizado na vigência do contrato e instruído com demonstração objetiva do impacto.
Como se preparar para a transição (passos práticos)
Comece mapeando todos os contratos vigentes que contenham cláusulas de preço bruto, preço líquido ou referências diretas a PIS/Cofins, ICMS ou ISS. Modele cenários de substituição usando as alíquotas‑teste de 2026 e projeções de alíquotas de referência (a serem fixadas pelo Senado e calibradas pelos entes) para estimar gatilhos de renegociação.
Atualize sistemas para emitir documentos fiscais no layout compatível com a CBS/IBS e garantir o cumprimento das obrigações acessórias — condição relevante para dispensa de recolhimento na fase de prova. Revise cláusulas de ajuste tributário, repactuação e matriz de riscos em contratos públicos e privados; alinhe as áreas fiscal, jurídica e comercial para evitar repasses tardios ou descasados. Pesquisas empresariais mostram que quem se prepara cedo reduz custos de adaptação e risco de disputas quando a carga efetiva mudar.
FAQ – Perguntas frequentes
1. Quando começo a destacar CBS e IBS nas notas?
O destaque ocorre já no ano‑teste de 2026 (0,9% CBS; 0,1% IBS), com valores compensáveis e possibilidade de dispensa do recolhimento para quem cumprir as obrigações acessórias previstas.
2. O período de transição da Reforma Tributária termina quando?
O cronograma leva a substituição integral dos tributos antigos pelo modelo CBS/IBS em 2033, após etapa progressiva que se estende de 2026 a 2032.
3. Posso pedir reequilíbrio se a carga tributária do contrato público aumentar?
Sim, desde que demonstre impacto e respeite a matriz de riscos: a Lei 14.133/2021 e a jurisprudência destacada pelo TCU admitem recomposição diante de criação ou majoração de tributos supervenientes; análises jurídicas sobre a reforma reforçam essa possibilidade.
4. Contratos privados precisam ser revistos?
É prudente. Especialistas recomendam ajustar cláusulas de preço, repasse de tributos e hardship para lidar com variações durante a transição até 2033, evitando litígios futuros.
5. As alíquotas já estão definidas?
Ainda não. As alíquotas de referência serão fixadas pelo Senado e poderão ser ajustadas pelos entes; estimativas preliminares circulam no mercado, mas os percentuais finais dependerão de calibragem após a fase de teste.